Chegámos a Hué e a decepção não podia ser maior. Chovia como se o mundo fosse acabar naquele final de tarde, e nós, abrigados debaixo do telheiro da estação de comboios, observávamos aquela espécie de dilúvio bíblico enquanto esperávamos que alguém do hotel nos viesse buscar.
Será que nada corre bem? Primeiro a meteorologia e agora só faltava mesmo era que tivéssemos de apanhar um táxi para chegar ao centro da cidade.
Meio atrapalhado lá apareceu o chauffeur, que prontamente se desculpou pelo atraso, convidando-nos de imediato a entrar.
Desembarcámos e o rápido check-in foi realizado enquanto saboreávamos um delicioso sumo de fruta. Que serviço...Transporte gratuito desde a estação, refresco de boas vindas, bicicletas e um quarto todo catita. Ainda que a tarde não tenha começado da melhor forma acabámos por rapidamente nos render à simpatia e ás comodidades que encontrámos no DMZ Hotel.
Por esta altura a noite já havia caído e de impermeáveis vestidos saímos à rua em busca de um restaurante sem nos afastamos muito, até porque a chuva continua a não dar sinal de abrandar.
DOIS DIAS EM HUÉ - A NOSSA SUGESTÃO DE ROTEIRO
.DIA 1 - PASSO A PASSO PELA ANTIGA CIDADE IMPERIAL DO VIETNAME
Depois de uma noite bem dormida, acordámos e quase por instinto corremos em direção à janela do quarto. Lá fora o céu continuava cinzento, mas parecia por agora ter dado as tão desejadas tréguas.
Estávamos com pressa de começar a explorar a cidade, vestimo-nos, tomámos o pequeno almoço reforçado e ainda não deveriam ser oito e meia da manhã quando agarrámos nas nossas bikes e nos lançámos à descoberta da cidade.
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Ponte Trang Tien |
Pedalámos pelas movimentadas ruas da cidade, cruzámos o rio pela Ponte Trang Tien e pouco depois chegávamos àquela espécie de fortaleza que em tempos protegera a Cidade Púrpura Proibida, local onde residia o imperador e toda a sua família.
Para aceder ao complexo atravessámos o enorme fosso e uma vez que não é permitida a circulação de qualquer tipo de veículo dentro do complexo fomos de imediato "convidados" a estacionar as bicicletas num pequeno parque improvisado ali existente.
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Caminhámos até à bilheteira e comprámos um bilhete que combina as entradas na cidadela e nos túmulos de Khai Dinh e Minh Mang. Este ingresso é na verdade uma excelente opção para quem conta passar mais de um dia a explorar a cidade e arredores, pois é válido por dois dias, permitindo assim poupar algum dinheiro. O valor total dos ingressos quando comprados separadamente é ligeiramente superior.
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Entrada principal da Cidadela |
Acedemos à Cidadela pela porta principal, por aqui chamada de Ngo Mon e depois de atravessar um grande pátio apressámo-nos a visitar o Palácio da Suprema Harmonia (Thai Hoa) suportado por oitenta colunas de madeira. Lá dentro e para além da bonita decoração, destacamos o imponente trono situado no centro da sala e que tantas vezes foi ocupado pelo imperador durante as cerimónias imperiais e recepções oficiais.
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Entrada do palácio da suprema harmonia |
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Interior do palácio da suprema harmonia |
A visita prossegue com breves passagens por meia dúzia de pequenos templos, até que a certa altura chegamos ao principal acesso da Cidade Púrpura Proibida que segundo percebemos era considerada a área mais sagrada de todo o complexo.
Esta espécie de cidade dentro da cidade é composta por diversas residências, palácios, bibliotecas, teatros, templos e bonitos jardins.
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Sala de leitura do imperador |
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Jardins |
Infelizmente todo o complexo sofreu bastantes danos aquando dos bombardeamentos que ocorreram durante a guerra do Vietname e em vários locais ainda é possível ver as "feridas" deixadas por esse triste acontecimento. Ainda assim alguns espaços têm vindo a ser recuperados e pouco a pouco estes tesouros do passado vão começando a apresentar um aspeto muito idêntico ao original.
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Edifício recentemente restaurado |
Um dos excelentes exemplos do bom trabalho de recuperação realizado nos últimos anos é o Teatro Real, originalmente construído em 1826 e o local onde o imperador assistia a espetáculos tradicionais executados em sua honra. À semelhança do que acontece um pouco por todo o complexo, também aqui o interior é claramente decorado com motivos chineses, mostrando as influências que o Vietname sofria no início do século XIX.
Depois de mais de 180 anos e de forma ocasional, este teatro ainda é usado para pequenas representações de algumas companhias locais.
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Teatro imperial |
Ainda que o Teatro Imperial tenha sido o último grande edifício que visitámos dentro do complexo, não nos despedimos da Cidadela sem antes nos passearmos pelos bem tratados jardins ali existentes.
Voltámos a pegar nas bicicletas e mantivemo-nos focados nos pontos de interesse presentes nesta área, pedalando largos minutos ao longo do Rio do Perfume até chegarmos a um dos mais importantes templos do país. A Pagoda Thien Mu foi terminada em 1601 e ainda hoje é considerada um dos espaços religiosos mais antigos do Vietname. Vale a pena fazer referência à lindíssima Torre Octogonal que se encontra no pátio principal e que segundo dizem é a maior deste género no Vietname.
Para além do seu cariz religioso, este templo tem igualmente um grande peso sentimental para as gentes da região, uma vez que foi deste local que em 1963 saiu um monge em direção à capital com o propósito de protestar contra o regime do presidente Ngo Dinh Diem. Uma vez chegado a Saigão, o homem acabou por se auto-emular, transformando este ato macabro num dos acontecimentos mais marcantes na história da nação .
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Pagoda Thien Mu |
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Torre octogonal
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Portais de acesso ao templo |
A entrada no santuário é feita através de um portal composto por três arcos, cada um deles vigiado por um par de estátuas de madeiras apelidadas de Guardiões do Templo.
A estrutura propriamente dita é na realidade bastante modesta e qualquer pessoa pode aceder gratuitamente ao seu interior, respeitando obviamente as regras impostas: Retirar os sapatos, vestir-se de forma adequada e manter uma postura de respeito.
Apesar de ficar um pouco distante do centro da cidade, este é um dos locais que fazem parte do roteiro turístico de Hué, estando muitas vezes fortemente congestionado por grupos de visitantes.
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Guardiões do templo |
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Aceso à pagoda |
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Interior |
Uma hora bastou para a visita e num piscar de olhos estávamos de regresso à estrada. Fizemos o caminho no sentido contrário, voltámos a travessar o rio, almoçámos num pequeno restaurante e ali mesmo traçámos um roteiro simples que nos mantivesse ocupados nas horas que nos restavam.
As nossas escolhas recaíram sobre a Pagoda Tu Hieu situada a 5km's de Hué e o Túmulo do Imperador Tu Duc 2km's mais à frente.
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Entrada da Pagoda Tu Hieu |
As indicações para chegar ao primeiro objetivo da tarde eram pouco claras, levando a que por um par de vezes tenhamos seguido por caminhos errados. Depois de reorganizarmos ideias, de consultarmos o mapa uma e outra vez e de inquirirmos vezes sem conta quem por nós ia passando, alcançámos o bonito portal que assinala a entrada da Pagoda Tu Hieu, situada no meio de uma densa floresta.
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Entrada da Pagoda Tu Hieu |
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A pagoda |
Apesar de já terem passado mais de 150 anos desde a sua construção, constatámos que as tradições continuam a ser respeitadas, uma vez que aquando da nossa passagem testemunhámos o momento em que a pequena comunidade de monges residentes se reuniu para efetuar uma das cinco orações diárias.
Rendemo-nos à bonita paisagem que rodeia o templo e aproveitámos para passear por todo o espaço, tirando partido da tranquilidade e da fraca presença de visitantes.
A nossa próxima paragem seria o Mausoléu do Imperador Tu Duc, e ainda que no nosso mapa o complexo aparentasse ficar a uma curta distância, tentámos confirmar a informação para que desta vez a viagem se desenrolasse sem qualquer imprevisto. As indicações foram-nos dadas de forma clara e o trajeto acabou por ser realizado em meia dúzia de minutos.
Este túmulo encontra-se inserido num enorme complexo composto por templos, lagos, pavilhões e palácios, tendo sido ocupado pelo Imperador no período que antecedeu a sua morte.
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O lago |
Encontrámos um local seguro para deixar as bicicletas e uma vez no interior do espaço fomos imediatamente arrebatados pela beleza de tudo o que nos rodeia. À nossa frente temos um enorme lago que em certas alturas do ano chega a ficar completamente coberto de flores de Lotus, um espetáculo que infelizmente não tivemos a sorte de assistir.
Depois de transpormos a Porta Khiem Cung, atravessámos vários outros portais de menores dimensões e uma sucessão de pátios flanqueados por bonitos pavilhões de madeira onde certamente o imperador se passeou durante a sua estadia.
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Porta Khien Cung |
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Pavilhão residencial |
Numa área situada do lado direito do Pavilhão Residencial encontra-se o Túmulo do Imperador Tu Duc .
A zona está dividida em vários patamares. No primeiro é possível ver dezenas de estátuas de pedra representando um exército de mandarins que de forma simbólica ainda protegem o Imperador. O segundo patamar é ocupado por um bonito pavilhão que no seu interior contêm uma enorme lápide onde foram gravadas algumas palavras ditas por Tu Duc antes da sua morte.
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Estátuas dos Mandarins |
O terceiro e último patamar é onde se encontra o sarcófago de pedra que guarda o corpo do imperador. Contra todas as expectativas este é muito provavelmente o local mais modesto de todo o complexo, o que nos surpreendeu bastante uma vez que estávamos à espera de encontrar algo suntuoso ou pelo menos que refletisse de forma mais vincada a verdadeira importância da pessoa ali sepultada.
Afinal e tal como acontece muitas vezes a beleza está na simplicidade. Talvez tenha sido essa a mensagem que o Imperador quiz tentar passar ás gerações futuras.
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Esquema do Complexo |
E foi assim que passámos mais um dia da nossa incrível viagem pelo Vietname. Desta vez focámo-nos na histórica cidade imperial de Hué onde continuaremos no dia seguinte.
A nossa aventura irá prosseguir com um bonito passeio de barco ao longo do Rio do Perfume e com visitas aos Túmulos de Khai Dinh e Minh Mang.
.DIA 2 - À DESCOBERTA DOS TÚMULOS DE KHAI DINH E MINH MANG
O dia amanheceu praticamente idêntico ao anterior. O céu mantém-se cinzento e a temperatura que se faz sentir obriga-nos a cobrir o corpo com um agasalho extra.
Deixámos o hotel e as nossas atenções focaram-se de imediato no caís de Hué, uma vez que seria nessa área que tentaríamos apanhar um barco que nos permitisse desfrutar de um tranquilo passeio pelas águas do Rio do Perfume ao mesmo tempo que víamos a cidade de uma outra perspectiva. Este passeio serviria igualmente para que sem grande esforço físico conseguíssemos chegar aos Túmulos Imperiais situados numa área distinta daquela que havíamos visitado na véspera.
Perante as dezenas de embarcações típicas (Dragon Boats) ancoradas no caís, o nosso primeiro objetivo seria conseguir negociar um preço que achássemos aceitável, deixando desde logo bem claro quais seriam as nossas pretensões.
Depois de alguma argumentação conseguimos atingir um valor justo para ambas as partes (15 USD) que incluía o trajecto até aos Túmulos dos Antigos Imperadores Khai Dinh e Minh Mang e regresso ao ponto de partida.
Ficou igualmente acertado que o pagamento seria realizado no final da viagem.
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Dragon boats no caís de Hué |
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Dragon boats Hué |
Fomos então convidados a entrar no barco e após algumas explicações demos início à viagem que segundo havíamos lido era um passeio bastante agradável, que finalmente iria dar o merecido descanso ás nossas pernas.
O que não dava mostras de querer melhorar era o tempo, que a certa altura ainda nos presenteou com algumas gotas de chuva, ainda que este pequeno contratempo não tenha afetado em nada a viagem. O barco avançava lentamente e aqui e ali fomos observando os habitantes locais que ora nas suas embarcações, ora nas suas modestas casas iam realizando as suas atividades diárias.
Pouco depois de passarmos sobre a Ponte Câu Dã Viên avistámos a Pagoda Chien Mu que havíamos visitado no dia anterior e que desta perspectiva nos pareceu ainda mais bonita.
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As paisagens que desfilavam diante nós mantiveram-nos de tal forma entretidos que só nos apercebemos que já haviam passado duas horas quando o barco se aproximou de uma das margens e nos foi transmitido que era naquele ponto que deveríamos desembarcar de forma a podermos aceder ao Túmulo do Imperador Khai Dinh.
Assim o fizemos e ainda que soubéssemos de antemão que a distância entre este ponto e o local que queríamos visitar não seria superior a 2km's, acabámos por ceder ao charme das duas senhoras que estrategicamente posicionadas uns metros mais à frente se ofereceram (a troco de uma pequena contribuição) para nos levar até à porta de acesso ao Túmulo. Mais uma vez foi necessário fazer uso das nossas capacidades de negociação que acabaram por ser suficientemente convincentes para que as sempre sorridentes senhoras nos levassem até ao túmulo e trouxessem de volta por 50.000VND cada um.
O trajeto não levou mais de cinco minutos e uma vez chegados à entrada do complexo não precisámos de comprar o bilhete de acesso uma vez que este local estava incluído no ingresso combinado que havíamos adquirido na véspera.
O Túmulo do penúltimo Imperador da dinastia Nguyên que governou o país entre 1916 e 1925 demorou oito anos a ser construído e a sua admiração especial por tudo o que se relacionava com o ocidente está bem presente na maioria dos detalhes espalhados pelo complexo. Uma das grandes diferenças entre este Túmulo e todos os outros existentes na região é o facto de ter sido totalmente construído em cimento, algo nunca visto até então. Outra característica que o diferencia dos demais são as estátuas dos mandarins (situadas no segundo patamar) esculpidas com faces de aparência euro-asiática.
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Túmulo do Imperador Khai Dinh |
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Mandarins |
Estávamos de tal forma absorvidos pela beleza do que connosco se ía cruzando que fizemos questão de percorrer calmamente todo o espaço, subindo pouco a pouco os diversos lanços de escadas que inevitavelmente nos conduziram ao terceiro e último patamar, onde se encontra um palácio finamente decorado que no seu interior acolhe o sarcófago do antigo imperador.
Se o exterior impressiona o que dizer do que testemunhámos para lá do bonito portal de pedra que assinala a entrada na área mais importante do complexo. Este é sem dúvida um espaço digno de um imperador. O palácio está dividido em três salas das quais se destacam a segunda e a terceira por serem as mais impressionantes e nas quais podemos ver alguns objetos pessoais, assim como uma estátua de bronze em tamanho real de Khai Dinh.
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Palácio |
Permanecemos no interior do palácio por largos momentos tentando admirar em detalhe alguns dos bem conservados trabalhos artísticos usados na sua decoração, sendo aquele agradável momento bruscamente interrompido por um barulhento grupo de asiáticos que acabou por fazer com que terminássemos a nossa visita de forma prematura.
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Estátua de Khai Dinh |
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O Túmulo |
De seguida e depois de terem passado mais de duas horas desde que deixámos as nossas "moto-táxistas", regressámos ao local combinado onde ambas as senhoras permaneciam (agora menos sorridentes) à nossa espera. Ainda que se esforçassem para que lhes pagássemos um pouco mais pela espera, recusámos de imediato e sem mais conversas seguimos em direção ao barco.
O próximo destino deste passeio pelo Rio do Perfume situa-se uns metros mais adiante, na margem oposta. A embarcação põe-se em movimento e num piscar de olhos voltamos a pisar terra firme para desta feita nos lançarmos à descoberta do Túmulo do Imperador Minh Mang. Ao contrário do que havia sucedido na visita anterior, agora só precisámos de caminhar uma centena de metros até à porta principal deste que é o maior complexo funerário existente na região de Hué.
A sua construção iniciou-se em setembro de 1840, mas quatro meses depois o imperador adoece e acaba por morrer. Com o túmulo inacabado, Minh Mang é substituído no trono pelo seu filho Thieu Tri que se compromete em honra do pai a terminar a obra. Em 1843 o espaço está finalmente pronto para receber o corpo do antigo imperador.
Ao todo são perto de quarenta edifícios, a maior parte deles perfeitamente dispostos em linha recta ao longo de 700 metros desde a porta principal até ao túmulo do Imperador situado no extremo oposto. A derradeira morada de Minh Mang situa-se no interior de uma colina artificial rodeada por um muro que a abraça em toda a sua totalidade, impedindo desta forma o acesso ao interior do espaço que só é aberto no dia do aniversário da morte do Imperador.
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Ponte sobre o lago da lua nova |
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Acesso ao túmulo do Imperador Minh Mang |
Depois de abandonarmos o túmulo regressámos ao barco e fizemos o trajecto no sentido contrário até ao centro de Hué.
Muito por culpa de uma chuva que assustou mas nunca atrapalhou, a nossa visita à antiga cidade imperial começou repleta de incertezas, mas agora, ao fim de quase 48 horas despedimos-nos completamente rendidos à sua beleza.
A viagem continua em Hanoi.
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