É-nos difícil eleger qual o local que mais nos fascinou durante a nossa viagem pela China. Na verdade foram vários, todos espetaculares mas a cidade de Pingyao ficará indiscutivelmente inscrita na lista de memórias especiais que nos acompanharão muito para além dos dias que por ali permanecemos.
Esta que é considerada a antiga cidade mais bem conservada de toda a China, foi na realidade um destino que esteve para não ser. Um ponto que se manteve intermitente até praticamente ao derradeiro minuto, mas que num impulso acabou por entrar nos nossos planos de viagem.
Sabíamos que tínhamos de acordar cedo. Naquela manhã a cidade recebe-nos com frio e envolta numa ténue neblina que acentua ainda mais o ambiente enigmático das ruas onde alguns habitantes já circulam. No chão e sobre os telhados veem-se pequenos resquícios de gelo que nos dão a entender que durante a noite esta zona foi brindada com alguns flocos de neve.
Pouco a pouco o movimento vai-se intensificando e nesta nossa incursão matinal cruzamo-nos com homens e mulheres que de forma descontraída vão fazendo as compras do dia.
Fotografamos o quotidiano e o lado mais genuíno destas gentes. Pessoas que poderiam muito bem ser as mesmas que há um ou dois séculos pisavam estas lajes escorregadias que hoje nos levam sei lá onde.
Fazemos uma pausa. Enquanto se bebe um chá acompanhado como uns biscoitos comprados numa banca de rua reparamos que na mesa ao lado um grupo de velhos nos olham com curiosidade. Aceno com um ligeiro balançar da cabeça e num ápice aquela barreira é quebrada com um sorriso que rapidamente se transforma num punhado de palavras que infelizmente não entendemos.
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O relógio aproxima-se das nove da manhã e a cidade movimenta-se agora a um ritmo e com uma intensidade bem diferentes daquela que testemunhámos momentos antes. Até o sol acordou, ganhando rapidamente a força necessária para romper a camada de nuvens que ainda há pouco cobria grande parte do céu.
Sem surpresa as principais artérias vão perdendo o encanto à medida que são inundadas por grupos de turistas locais que acabam por apressar a nossa retirada para zonas menos preenchidas.
Contudo e antes de nos afastarmos alimentamos um pouco do nosso conhecimento sobre a cidade com a visita a alguns edifícios históricos. Estes antigos espaços são testemunhos melancólicos de um tempo que não volta atrás mas que ainda assim permanece gravado nas paredes, nos objetos e nos retratos que decoram cada uma das salas.
De forma surpreendente bastou-nos caminhar um par de minutos para a confusão que reina na área mais central se diluísse. Dá ideia que uma linha imaginária impede que os visitantes se movimentem entre estes dois mundos situados a escassos metros um do outro.
Estamos de volta à China do passado. Caminhamos agora sem destino, apenas pelo prazer de ali estar e de descobrir por acaso alguns pequenos tesouros.
A certa altura fazemos uma pausa e sentamo-nos no topo de uma escadaria que dá acesso a um templo. Daquele ponto de observação privilegiado deliciamo-nos com as casas de tijolo cinzento, com as portas de madeira adornadas com vistosos puxadores e com o olhar terno de uma velhota que meio envergonhada se aproxima na esperança que lhe compremos meia dúzia de pauzinhos de incenso.
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Naquele momento de descanso somos também abordados por uma família que um pouco a medo nos solicita para uma foto em conjunto.
Depois da pausa e da sessão fotográfica esgueiramo-nos para o interior do templo onde os nossos passos são embalados por um ritmo quase hipnótico. Uma melodia que se repete e se propaga por todo o espaço, misturando-se de forma natural com o tilintar dos pequenos sinos metálicos que pendem dos telhados do santuário.
O vermelho é a cor predominante, aliás tal como em grande parte dos templos que temos visitado nesta viagem. Dizem que atrai a boa sorte! É isso e o fumo dos incensos que ardem diante do edifício principal e trazem até nós um odor característico que já se tornou familiar.
Faz-se tempo de almoçar até porque a energia acumulada pelo pequeno almoço tomado horas antes parece por esta altura já se ter esgotado. Ainda assim e tendo em conta a urgência de situação, resistimos à tentação de regressar ao rebuliço central onde certamente encontraríamos com mais facilidade um local que nos permitisse saciar a fome.
Subitamente, no final da rua, vislumbramos meia dúzia de banquinhos de plástico coloridos que sugerem a presença de um pequeno estabelecimento onde finalmente aconchegamos o estômago com uma tigela de noddles.
No que resta do dia ainda visitamos mais um punhado de locais que achámos interessantes. Sem pressas calcorreámos as muralhas que abraçam a cidade e foi sentados aos pés de uma antiga torre de vigia que assistimos ao momento em que o sol se foi deitar.
Pela cidade acendem-se milhares de lanternas que pintam as ruas de tons vermelhos, transformando-as num mundo habitado por sombras abstratas que se misturam com quem por ali passa.
Aos poucos o silêncio volta a instalar-se trazendo com ele a pacatez do tal mundo de outrora que conhecemos no início da jornada.
Durante um dia percorremos uma China do passado mas com hábitos do presente.
São mais de dois mil anos de história encravados no interior de uma fortaleza que pouco a pouco vai sendo tomada pelo poder avassalador do turismo.
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